domingo, 30 de outubro de 2011

Como e porquê o trânsito enlouquece no Brasil (3º Ano)

Com Roberto DaMatta - Parte 1


A exposição do assunto começa mesmo lá pelo décimo minuto. Antes, ele faz uns comentários iniciais que não deixam de ser interessantes, mas que podem ser pulados.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Ipea aponta manipulação em índice de criminalidade no RJ


Morte de um Soldado Legalista, de Robert Capa, em 1936

Pesquisa apontou indícios de manipulação nas estatísticas oficiais de criminalidade do Rio de Janeiro que mostraram suposta queda no número de homicídios

Uma pesquisa do economista Daniel Cerqueira, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apontou indícios de manipulação nas estatísticas oficiais de criminalidade doRio de Janeiro que mostraram suposta queda no número de homicídios no Estado desde o início do primeiro governo Sérgio Cabral (PMDB).

Os números oficiais apontam diminuição de 28,7% nos assassinatos entre 2007 a 2009, mas o estudo de Cerqueira, doutor em economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-RJ) mostra que o Estado pode ter ocultado do número total as mortes com causa externa indeterminada, nas quais o motivo não é definido entre homicídio, suicídio e acidente. Os óbitos externos sem motivação determinada passaram de 1.857, no período de 2000 a 2006, para 4.021 entre 2007 e 2009.

O estudo mostra que o perfil das vítimas do homicídio é bem diferente dos mortos em acidentes e suicidas. Os assassinados são jovens com cerca de 20 anos, pretos ou pardos, estudaram no máximo até o ensino fundamental e 80% são mortos por armas de fogo na rua. Já o suicida típico é branco, tem em torno de 45 anos e morre enforcado em casa. Vítimas de acidentes violentos são comumente idosos, entre 70 a 80 anos, com pouca escolaridade. Na maioria das mortes catalogadas como "causa indeterminada" no Rio a vítima é jovem, estava na rua e foi morta a tiros - perfil típico da vítima de assassinato - o que pode ser indício da manipulação.

O número de mortes indeterminadas, cujas vítimas foram vítimas de Perfuração de Arma de Fogo (PAF) cresceu 263% nos últimos três anos no Estado. Apenas em 2009, 2.797 pessoas morreram sem que o Instituto Médico-Legal sequer apontasse a causa. A pesquisa de Cerqueira, "Mortes violentas não esclarecidas e impunidade do Rio de Janeiro" foi divulgada no site do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Inconsistências nas estatísticas de mortes por causas externas não determinadas no Rio já tinham sido apontadas pelo jornal O Estado de S.Paulo em sua edição de 7 de junho.

Responsável pela divulgação dos índices de criminalidade no Rio, o Instituto de Segurança Pública (ISP) não se manifestou sobre o assunto. O órgão é dirigido por oficiais da Polícia Militar desde 2008, quando a ex-diretora, a antropóloga Ana Paula Miranda foi demitida após recorde de pessoas mortas pela polícia nos autos de resistência (suposto confronto entre agentes e criminosos). Na ocasião, ela acusou a Secretaria de Segurança Pública do Rio de "fabricar a queda de homicídios".

Desde março, após o Ministério da Saúde cobrar explicações, a Secretaria de Saúde e o ISP formaram um convênio para esclarecer os casos de morte de "intenção indeterminada". No entanto, nenhum resultado foi divulgado até o momento. A Polícia Civil do Rio informou que se pronunciará apenas amanhã sobre o estudo. O Ministério da Saúde apenas informou que não recebeu a pesquisa e que a responsabilidade sobre o preenchimento dos registros é dos Estados.

Fonte: Agencia Estado - 23/10/2011

Indicação de Site de onde se pode baixar a pesquisa: 

http://www2.forumseguranca.org.br/content/mortes-violentas-n%C3%A3o-esclarecidas-no-rio-de-janeiro

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

As virgens juramentadas: mulheres com voto de virgindade vivem como homens

Pashe Keqi recorda-se do dia, quase sessenta anos atrás, em que decidiu transformar-se em um homem. Ela cortou os seus longos cachos de cabelos negros, trocou o vestido pelas calças largas do pai, armou-se de um rifle de caça e jurou que jamais se casaria, teria filhos ou faria sexo. Esta mulher de 78 anos que fez voto de virgindade em troca do direto de viver e liderar a sua família como um homem diz que, caso tivesse nascido na Albânia de hoje, escolheria ser mulher.

Pashe Keqi - FOTO: Johan Spanner, New York Times


"Naquela época, era melhor ser homem porque, antes, as mulheres e os animais eram considerados uma coisa só", diz Keqi, que tem uma voz forte de barítono, senta-se com as pernas abertas como um homem e gosta de tomar tragos de raki e de fumar cigarros. "Agora as mulheres albanesas têm direitos iguais aos dos homens e são até mais poderosas. Acho que atualmente seria divertido ser mulher".

Essas virgens juramentadas tornaram-se patriarcas das suas famílias, com todas as prerrogativas da autoridade masculina, ao fazerem voto permanente de virgindade.O ritual era uma forma de conquista de poder pessoal para as mulheres da zona rural de uma região terrivelmente pobre e regida por valores machistas, que ficou isolada do resto da Europa durante décadas, sob uma ditadura stalinista. Mas na Albânia contemporânea, com paqueras pela Internet e a MTV, esse costume está desaparecendo. As meninas não querem mais ser meninos.

A tradição das virgens juramentadas remonta ao Kanun de Leke Kukagjini, um código de conduta que foi passado verbalmente entre os clãs do norte da Albânia durante mais de cinco séculos. Segundo o Kanun, o papel das mulheres era severamente restrito. Elas tomavam conta das crianças e do lar. Embora a vida de uma mulher valesse a metade da vida de um homem, a de uma virgem tinha o mesmo valor que a deste último -12 bois. A virgem juramentada foi um fruto da necessidade social em uma região agrária flagelada pela guerra e pela morte. Caso o patriarca da família morresse sem deixar herdeiros masculinos, as mulheres casadas da família poderiam ver-se sozinhas e sem poder algum. Ao fazer um voto de virgindade, as mulheres podiam assumir o papel masculino como chefes de família, portar armas, ser proprietárias e locomover-se livremente.

Pashe Keqi - FOTO: Johan Spanner, New York Times

Pashe Keqi - FOTO: Johan Spanner, New York Times
Elas vestem-se como homens, adotam uma postura masculina e passam a vida na companhia de outros homens.Algumas também fizeram o voto como forma de evitar os casamentos arranjados. E outras tornaram-se virgens juramentadas para expressar a sua autonomia. Algumas arrependeram-se do sacrifício, voltaram a ser mulheres e, mais tarde, casaram-se.

"Renunciar à sexualidade ao jurar permanecer virgem era uma forma encontrada por essas mulheres para engajar-se na vida pública em uma sociedade segregada e dominada pelos homens", afirma Linda Gusia, professora de estudos da mulher da Universidade de Pristina, em Kosovo.

"Tratava-se de sobreviver em um mundo no qual os homens mandavam".

Segundo os sociólogos, o fato de uma pessoa fazer um voto de virgindade não quer dizer que ela seja homossexual, algo que há muito tempo é um tabu na Albânia rural. E as mulheres tampouco passam por mudança de sexo. Na zona rural do norte da Albânia, restam ainda cerca de 40 virgens juramentadas, segundo os pesquisadores que estudam esse costume. Conhecida em casa como "Pasha", Keqi conta que decidiu tornar-se o homem da casa aos 20 anos, quando o seu pai foi assassinado durante uma briga. Os seus quatro irmãos opuseram-se ao regime comunista de Enver Hoxha, que governou a Albânia durante 40 anos, até a sua morte em 1985, e foram ou presos ou mortos. Ela diz que tornar-se homem foi a única forma que encontrou de sustentar a mãe, as quatro cunhadas e os cinco sobrinhos.

Reinando sobre a grande família na sua casa modesta em Tirana, onde as sobrinhas lhe servem brandy enquanto ela grita ordens, Keqi diz que viver como homem lhe permitiu ter a liberdade negada a outras mulheres. Ela podia trabalhar na construção civil e rezar na mesquita ao lado dos homens. Mesmo hoje, os seus sobrinhos dizem que não ousariam casar-se sem a permissão do "tio".

Pashe Keqi - FOTO: Johan Spanner, New York Times
"Como homem eu tinha total liberdade porque ninguém sabia que eu era mulher", diz Keqi. "Eu podia ir aonde bem entendesse e ninguém ousava me xingar porque tomaria uma surra. Eu só convivia com homens. Não sei como as mulheres falam. Nunca sinto medo". Ela recorda-se de que, quando foi recentemente hospitalizada para passar por uma cirurgia, as outras mulheres no quarto ficaram horrorizadas ao descobrir que compartilhavam o aposento com um homem, e pediram transferência para um outro quarto.
Keqi afirma que o fato de ser mulher fez dela um homem mais compassivo.

"Quando outros homens desrespeitavam uma mulher, eu dizia a eles que parassem". Ela diz que o fato de ter sido privada de uma vida de intimidade sexual foi um sacrifício necessário. Ela acrescenta que não sente falta de filhos, porque sempre esteve rodeada de sobrinhas e sobrinhos. "Quando a minha convicção chegou a 100%, tive forças para jamais retroceder".

Ser o homem da casa também a tornou responsável por vingar a morte do pai, conta ela, citando o edital de Kanun que preconiza que o sangue derramado deve ser respondido com sangue derramado. Quando o assassino do seu pai foi libertado da prisão cinco anos atrás, com 80 anos de idade, ela ordenou ao seu sobrinho de 15 anos que o matasse a tiros. A seguir, a família do homem vingou-se, matando o sobrinho dela.

"Sempre sonhei em vingar a morte do meu pai. Os meus irmãos tentaram, mas não conseguiram. É claro, lamentei o fato de o meu sobrinho ter sido assassinado. Mas se você me mata, eu tenho que matá-lo". Na Albânia, um país majoritariamente muçulmano, o Kanun é seguido tanto por muçulmanos quanto por cristãos, embora os turcos otomanos e os sucessivos governos tenham tentado limitar a sua influência.
Os pesquisadores da história albanesa dizem que o apego a costumes medievais há muito descartados em outros locais foi um subproduto do isolamento do país. Mas eles frisam que hoje em dia o papel tradicional da mulher albanesa está mudando.

"Atualmente a mulher albanesa é uma espécie de ministra da Economia, ministra do Afeto e ministra do Interior que controla quem faz o que", diz Ilir Yzeiri, um crítico que escreve sobre o folclore albanês. "Hoje em dia as mulheres albanesas participam de tudo".
Algumas virgens juramentadas criticam essa liberação feminina. Diana Rapiki, 54, guarda de segurança na cidade litorânea de Durres, no oeste da Albânia, que fez voto de virgindade para tomar conta das nove irmãs, diz que tem saudade da era Hoxha. Durante a era comunista, ela foi oficial graduada do exército, treinando soldados mulheres para combate.

"Agora as mulheres não sabem mais o seu lugar", lamenta ela.

"Hoje em dia as mulheres vão às discotecas semi-nuas e não conhecem limites", afirma Rakipi, que cortou os cabelos bem curtos e usa uma boina militar. "Durante a minha vida toda fui tratada como homem, sempre com respeito. Não sei limpar uma casa, passar roupa e nem cozinhar. Isso é trabalho de mulher".
Mas até mesmo nas remotas montanhas de Kruje, cerca de 50 quilômetros ao norte de Tirana, onde as estradas de terra serpenteiam entre olivais, os moradores locais dizem que a influência do Kanun sobre os papéis dos sexos está desaparecendo. Eles afirmam que a erosão da família tradicional, na qual todos vivem sob o mesmo teto, alterou a posição das mulheres na sociedade.
"Atualmente as mulheres e os homens são quase iguais", diz Caca Fiqiri, cuja tia, Qamile Stema, 88, é a última virgem juramentada da vila. "Nós respeitamos bastante as virgens juramentadas e as consideramos homens devido ao grande sacrifício que fizeram. Mas não existe mais nenhum estigma devido ao fato de não haver um homem na casa".

Pashe Keqi - FOTO: Johan Spanner, New York Times
Mas não há dúvida quanto a quem usa as calças na casa da família, de pedra e com um só aposento, em Barganesh, a vila ancestral de Fiqiri. Lá, recentemente, o "tio" Qamile foi rodeado pelo seu clã, usando um qeleshe, o chapéu branco tradicional dos homens albaneses. A sua única concessão à feminilidade eram sandálias de dedo cor-de-rosa. Apontando para uma antiga foto preto e branco pendurada sobre à entrada da casa -mostrando um belo rapaz- Stema diz que fez o voto de virgindade aos 20 anos, depois que o pai morreu, e que era a mais velha de nove irmãs.

Após tornar-se homem, Stema diz que pôde sair de casa e rachar lenha com os outros homens. Ela portava uma arma. Nos casamentos, sentava-se com os homens. Ela lembra-se de que quando falava com as mulheres, estas recuavam envergonhadas. Stema diz que o voto de virgindade foi uma necessidade e um sacrifício.

Rakipi - FOTO: Johan Spanner, New York Times
"A verdade é que às vezes sinto-me solitária. Todas as minhas irmãs morreram, e eu vivo sozinha. Mas eu nunca quis me casar. Certas pessoas em minha família tentaram fazer com que eu trocasse de roupa e usasse vestidos, mas quando viram que eu havia me tornado homem, me deixaram em paz". Stema diz que morrerá virgem. Ela brinca, dizendo que, caso tivesse se casado, teria sido com uma mulher albanesa tradicional. "Creio que pode-se dizer que eu sou meio mulher, meio homem, mas é claro que nunca fiz tudo que um homem faz", diz ela. "Gostei da minha vida como homem.

Fonte: International Herald Tribune